Antes das oito já estávamos na água. A
brandura do sol poupava nossas peles claríssimas. Ele mostrava, eu imitava. Logo
consegui acompanhá-lo em ousadas aventuras, na verdade limitadas a minúsculas
incursões mar adentro.
De volta à areia, mordicando o infalível
picolé, tinha meus olhos fixos na Baía da Guanabara. Imaginava navios robustos,
portos acolhedores em terras estranhas. Eu me via timoneiro, singrando mares revoltos
e desembarcando vitorioso em lugares exóticos, um mundo inteiro à minha espera.
Quem teria coragem de desiludir um menino em êxtase, explicando que a cidadela ao
longe era apenas o Morro da Viúva, do outro lado da Enseada de Botafogo?
A caminho de casa, esticava o pescoço
para alcançar a janela do Pontiac paterno, pintado em duas cores que lembravam
um capuccino. Parávamos para nos
debruçar na mureta de uma pontezinha, em torno da qual pequenas embarcações permaneciam
ancoradas. Há um certo encanto em barcos vazios, balançando suavemente ao ritmo
das marolas produzidas pelo vento que acaricia águas mansas. E eu, hipnotizado
por aqueles perfis coloridos, madeiras de tons variados, mastros de todos os
tamanhos e portas pequenas que pareciam feitas para uma criança. Com navios
assim, eu conquistaria o mundo.
Com o tempo, a poluição arruinou a Baía. Escolhi
uma praia oceânica. Ainda que raramente, ia no final da tarde com um livro, quando
o sol já buscava o poente. As areias estavam frescas e desertas e as águas, embora
mais agitadas, lembravam a Urca. Volta e meia largava a leitura e fitava o
horizonte, tantos mares ainda por navegar, aventuras por viver.
Desmentindo meu sonho aventureiro,
sentia-me bem naquele ambiente tranquilo, de pouco calor e gente escassa. Mais
tarde, na juventude, minha presença nas praias lotadas em horários insalubres
só se justificaria pelas lindas mulheres curvilíneas e bronzeadas que, em
geral, só me deixavam de lembrança a pele ardida e aplicações de Caladryl...
Afinal, raras vezes estive num barco.
Mas, assim como nadei através do exemplo, cresci aprendendo com o caráter, a coragem
e a determinação com que meu pai passou a vida enfrentando mares metafóricos,
de peito aberto para chegar, vitorioso, à outra margem. Ainda o sinto ao meu
lado, a cada luta, a cada conquista, hoje, sempre.
Rafael Linden
Olá Rafael.
ResponderExcluirÓtimo Texto
Post divulgado.
Até a próxima.
Valeu, amigo.
Excluirabraços
Rafael