Este fenômeno é a passagem daquele planeta entre o Sol e a Terra projetando um pequeno círculo escuro que, por algumas horas, desliza sobre a imagem do astro-rei à medida que os planetas se movem em suas órbitas*. Sua última ocorrência no século XXI será em junho de 2012, mas não poderá ser vista na maior parte do Brasil. Depois, só se repetirá daqui a cento e cinco anos! As gerações atuais perderão, assim, sua derradeira oportunidade de apreciar o passeio da deusa diante do sol.
Aqui na Terra mesmo, ninguém é indiferente
ao mito ou à sua controversa origem. Afrodite seria fruto da espuma que brotou
da genitália de Urano atirada ao mar depois de castrada por Cronos ou, na opinião
de Homero, teria resultado da união de Zeus com Dione. O pintor florentino
Sandro Botticelli ofereceu uma versão poética de seu nascimento, outros artistas
eternizaram cenas de sua vida íntima e Woody Allen a homenageou em um filme antológico.
Dentre imagens de placidez ou de carinho, divulgou-se também amplamente o
desejo incontrolável da deusa pelo belo Adonis.
Já o parmesão Antonio da Correggio pintou
o flagrante de um sátiro desnudando a deusa adormecida ao lado de Eros. Sátiros
lascivos são comuns nas proximidades de Afrodite, sempre ávidos por seu corpo. E,
talvez, sua alma. Afinal, até os nomes Eros, para os gregos, ou Cupido para os
romanos, se traduzem como desejo, embora o pequeno arqueiro seja reconhecido
como o mensageiro do amor...
Minha imagem predileta, no entanto, é uma
escultura de mais de dois mil anos de idade, que se encontra no Museu
Arqueológico de Atenas e representa Afrodite, Eros e o sátiro Pan**. Em mármore,
Afrodite repele a chineladas o assédio do fauno tarado, enquanto Eros esvoaça
em torno do quiproquó. Também, quem manda aquele bode velho se engraçar com a
minha, a nossa deusa! Mas, pensando bem acho que, entre outras coisas, o mito
de Afrodite nos atrai tanto porque no fundo aquela escultura representa todos
os que já foram repelidos pelos objetos de suas paixões, os quais frequentemente se
atiram aos pés de um Adonis qualquer e, ato contínuo, tratam os feinhos a
sapatadas...
E, assim, o trânsito de Venus transcende a
Ciência e mergulha na Poesia. Os derrotistas, aprisionados nas órbitas
planetárias, já estão a ruminar a angústia da existência sem os encantos de
Afrodite. Os otimistas acham que, se não se dá o trânsito é porque a deusa escolheu
passear em frente à sua porta e, quem sabe, entrar de corpo e alma. Fico, é
claro, com a segunda opção.
Rafael Linden
* Veja
o link http://www.transitofvenus.org/
Simplesmente bárbaro
ResponderExcluirCaro amigo, obrigado. Mas assim me encabulas...
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