Uma das
razões pelas quais este cronista evita mergulhar fundo no próprio subconsciente
é que bem sabemos da nossa mania de conjuminar assuntos desconexos. Sabe-se lá
o que diria o velho Sigismundo ao topar com tal desvio. Portanto, queiram os
ilustríssimos leitores, por caridade, perdoar o título acima e, com todo o
respeito, conjuminemos.
Cada um
elege o assunto que lhe apraz. Então, esta semana escolhemos como a mais
palpitante a descoberta, feita pelo Ibama junto com a Polícia Federal, de que
uma jibóia valiosíssima foi vendida pela ex-administradora de um zoológico de
Niterói a um criador de serpentes norte-americano, que a contrabandeou pela
fronteira de Roraima com a Guiana e levou-a para os Estados Unidos. Levou a
cobra, bem entendido. A cobra réptil, melhor entendido ainda.
Acontece que
esse bicho é raríssimo - ao que parece é a primeira cobra portadora da condição
genética chamada leucismo, na qual partes ou até o corpo inteiro de um animal
são brancos devido a falta de pigmentação. Não é o mesmo que o albinismo, pois nesse
a cor dos olhos é vermelha. No caso em questão, trata-se de uma cobra com
corpinho todo branco e olhos negros. Não, minha senhora, o cronista não tem
leucismo, apenas não toma muito sol, entre outras coisas porque passa muito
tempo escrevendo besteiras nesse blog.
Consta que,
quando o tal zoológico foi fechado, a administradora levou a cobra para casa e,
tempos depois, declarou que o animal tinha morrido. Mas os federais encontraram
fotografias da senhora, toda sorridente, com o marido e mais o contrabandista
americano. E, ao vasculhar as redes sociais, acharam fotos da cobra com o gringo.
Há rumores de que filhotes desta jibóia branca tem sido vendidos por uma boa
grana, o que levou ao cálculo de que a mãe de todas as cobras vale coisa de um
milhão de dólares.
Não nos tocaria
tanto esta história, não fosse ela mais um exemplo de assalto ao patrimônio
genético que acontece aos montes do Oiapoque ao Chuí. E, não bastasse a
espionagem, o Obama teve sorte de, por poucos dias, escapar de ser enquadrado
em pirataria também. Sosseguem, porém, pois não será hoje que descambaremos
para o colunismo político, já mais do que saturado em todas as mídias. Conforme
reza a tradição deste espaço democrático onde eu mando sozinho, divaguemos
outrossim sobre os dois componentes da insólita notícia.
Em primeiro
lugar, a pele branca com olhos negros nos remete ao último filme da carreira da
maravilhosa atriz italiana Silvana Mangano. Aliás, passei décadas a pronunciar
seu sobrenome “Man-gâ-no”. Eu e todo mundo por aqui, acho. Pois hoje estava eu tão-somente
apreciando as imagens de um video falado em italiano no Youtube, quando descobri que na terra de Michelangelo e Berlusconi
diz-se “Mân-gano”, com acento na primeira sílaba. Este blog é pura cultura, não
é mesmo? Mas voltando ao assunto, a obra de 1987, dirigida pelo cineasta russo
Nikita Mikhalkov, era Oci ciornie, ou
seja “Olhos negros” e Silvana interpretava uma aristocrata chamada Elisa. A
trama envolvia a paixão que seu marido, um bon
vivant interpretado por - quem mais? - Marcello Mastroiani, nutria pela
personagem da então jovem atriz russa Yelena Safonova, de quem o homem de meia
idade se enamorou ao conhece-la num spa.
Preciso ver esse filme, dizem que é ótimo.
E de cobra,
o que mais se pode dizer? Já não basta a negociata? Pois tomem ciência de outra
história que envolve um americano e uma cobra. Há poucos meses estive em uma simpática birosca
chamada Tippi Teas em El Paso, no
Texas. É uma casa de chás de propriedade de um casal de remanescentes da era hippie. Pois eu soube que há tempos o marido
comprou uma cobra lá mesmo nos EUA. E, sabendo que seu novo animalzinho de
estimação era originário do México, não é que o cara levou consigo a cobra numa
viagem de avião ao país vizinho para que, segundo ele, a bichinha conhecesse a terra
natal?
Só que na
volta a cobra, que viajava enrolada no corpo do cidadão, deu de botar a cabeça
para fora da camisa dele e o vizinho de poltrona, ao perceber do que se tratava, começou a berrar como todo bom primata. O resultado foi um tempão perdido em
explicações junto às autoridades americanas até que, pasmem, o cidadão
conseguiu levar a criatura de volta para o Texas onde, presumo, os três, marido,
mulher e cobra, vivem felizes.
Só mesmo o
dono de um estabelecimento que vende uma centena de variedades de chás em
folhas, algumas das quais meio suspeitas, bem como roupas que parecem sobras dos
figurinos da peça Hair, consegue se
tornar personagem de uma história dessas que, devo no entanto admitir, é mais inocente
do que a saga da jibóia com leucismo. Afinal, que raio de obsessão estranha tem
esses americanos com cobras, né?
Rafael Linden
Adorei o texto! Muito divertido. Encontrei por acaso, mas pretendo voltar aqui mais vezes.
ResponderExcluirObrigado, Anônimo. Volte sempre, compartilhe com seus amigos!
ExcluirR
é esse cronista não tem leucismo :))) entendo perfeitamente o que é isso. Belo texto, BRAVO!!!
ResponderExcluirUm beijo enviado da cidade-luz.
CG
Obrigado, querida. Andou sumida...
ExcluirBjs
R
Olá Rafael, não é primeira vez que encontro seu blog através do geralinks, dessa vez não foi no site e sim e em um blog que exibia o link, mas em fim, isso é pra dizer o que quis dizer da outra vez (mas não disse porque essa coisa de comentário é muito burocrático - rsrs), você tem um talento sem igual pra argumentação, os seus textos empolgam e palavra por palavra a gente vai devorando os seus textos. Parabéns cara, você é incrível, virei fã!
ResponderExcluirMuito obrigado, Valter. E obrigado ao blog que divulgou o link!
ExcluirShow de bola!!!!!!!
ResponderExcluirObrigado, volte sempre!
ExcluirMeu Deus, pra que querem cobras?!!! rs
ResponderExcluirVai entender, né?
ExcluirR
Oi Rafa... Saudades! Andei sumida, ne?! Dei gargalhadas lendo sua cronica! Obrigada pelo presente! Foi uma otima maneira de fechar uma pesada semana de trabalho! Espero encontra-lo em breve para que juntos conjuminemos assuntos desconexos!!!! Bjks!
ResponderExcluirMarcinha, saudades de você também! Obrigado pela visita, e avise quando passar por estas bandas.
ExcluirBeijos
R