Queiramos ou
não, um dos assuntos do momento é o pau que come solto nas arquibancadas da
pátria amada. Para esclarecer de antemão, falamos de futebol. Apesar de briga entre torcidas organizadas não ser nenhuma
novidade, a transmissão ao vivo e em cores da pancadaria que abrilhantou um
sonolento jogo entre o Atlético Paranaense e o Vasco
da Gama, realizado em Joinville no início de dezembro, causou comoção nacional
e preocupa as autoridades esportivas. Pensando bem, isso não quer dizer nada, porque “autoridade
preocupada” é o que não falta por aí sem consequência alguma, como demonstra a
infalível repetição de nossas tragédias pluviais.
No entanto,
como estamos a menos de seis meses da próxima Copa do Mundo, as tais
autoridades subitamente se deram conta de que torcidas organizadas às vezes se
organizam mesmo é para torcer o pescoço dos outros. E tome entrevista coletiva,
pronunciamento e mesa redonda com farto cardápio de indignações, interpretações
sociológicas, culturais, políticas e psiquiátricas, apelos dramáticos e garantias de
policiamento, identificação, proibição, cadeia e tudo o mais que, até parece, jamais
nos ocorreu.
Então, para
não ficar de fora deste caloroso e, provavelmente, inócuo debate, vosso
cronista predileto vem a público oferecer sua inestimável contribuição. Diretamente
das cabines de imprensa, já instaladas no telhado para cobertura dos
palpitantes eventos esportivos de que a nação será orgulhosa anfitriã,
explicaremos a causa e informaremos a solução definitiva para a violência nos estádios,
cujos protagonistas quase sempre são truculentos homens feitos que deviam ter
ao menos um pingo de juízo.
Em poucas
palavras, a causa é falta de mulher e a solução é carinho feminino. E aí vai um
pouco de Ciência por trás dessa inequívoca conclusão. Como se fosse de
encomenda, esta semana foi publicado na revista científica Nature Neuroscience um artigo muito interessante sobre
agressividade. Os autores do trabalho são Quan Yuan, Yuanquan Song, Chung-Hui
Yang, Lily Yeh Jan e Yuh Nung Jan, os quais, é óbvio, são todos cientistas
da…Universidade da California em San Francisco. Os chefes da equipe, o casal
Lily e Yuh Jan, pesquisam há quarenta anos o desenvolvimento e a plasticidade do
sistema nervoso, usando como modelo de estudo a mosquinha da banana – que
atende pelo nome de Drosófila. Desta forma descobriram uma infinidade de
características genéticas e funcionais que foram, ao longo dos anos,
redescobertas ou comprovadas em outras espécies animais, inclusive em humanos.
Não sei se o
Doutor Yuh é vascaíno, mas o fato é que o grupo de pesquisa resolveu, agora,
estudar a agressividade, um comportamento universal e importante para a
sobrevivência individual e a organização social de grupos de animais, desde a aranha d’água – aquele
bichinho que caminha na superfície de poças, também chamado de “inseto-Jesus” –
até nós todos, inclusive o simpático casal que ora nos lê na tela do computador
de rostinho colado e curiosidade aguçada. Ora, direis, mosquinha agressiva?
Pois assim se espanta quem nunca viu dois machos de Drosófila a trocar socos e
pontapés para resolver quem pega a fêmea que esvoaça faceira, fazendo visage e passando rasteira. E, entre
outras características da mosquinha que a tornam um modelo riquíssimo para
pesquisa genética, há métodos consagrados para quantificar vários de seus comportamentos. Ou seja, um observador treinado é capaz de dar notas para a
agressividade e verificar se algum evento consegue diminui-la ou aumenta-la
mais ou menos do que outro evento.
Para
começar, não foi surpresa que dois machos mostram-se mais agressivos
um com o outro quando estão na presença de uma fêmea do que na ausência desta. Quando eles estão sós há escaramuças para definir territórios ou hierarquia,
mas na presença de fêmeas há um fortíssimo componente de agressividade de causa sexual. Porém, o mais interessante foi o que aconteceu quando os pesquisadores deixaram
machos em contato com fêmeas por 24 horas, antes de colocá-los na presença de
outro macho e de outra fêmea. Os felizardos ficaram muito menos
agressivos do que os que tinham passado o dia anterior solitários. E mais,
os pesquisadores mostraram que essa diminuição da agressividade era provocada
por substâncias que funcionam como atratores sexuais – chamados feromônios – que
passam das fêmeas para os machos através de contato físico entre o casal de
mosquinhas, não necessariamente durante a cópula e sim durante as
“preliminares”. Sim, minha senhora, até mosquinha de banana pratica
preliminares, pode contar para seu marido porque é mais ou menos assim mesmo.
Ou seja, carícia de mosca fêmea diminui a agressividade do seu respectivo
macho.
O estudo é
muito mais amplo, pois os cientistas fizeram ainda diversos experimentos
genéticos, bioquímicos e funcionais até desvendar boa parte dos
mecanismos envolvidos nesse efeito do contato físico entre machos e fêmeas. Mas
não vou cansá-los com detalhes. Apenas ressaltamos que este
trabalho mostra claramente o que fazer
para diminuir a violência nas arquibancadas. Basta que namoradas, esposas,
amantes ou quaisquer outras mulheres na vida dos torcedores fanáticos os acariciem antes que os mesmos partam para os estádios. Afinal, não foi
à toa que, há novecentos anos, o poeta Omar Khayyam escreveu – ou a ele se
atribui - ”os sábios não te ensinaram coisa alguma, mas a carícia dos longos
cílios de uma mulher poderá revelar-te a felicidade”. As mosquinhas aprenderam. Há uma chance, embora remota, de que o cérebro dos trogloditas que protagonizam
espetáculos dantescos como aquele de Joinville seja ao menos tão
sofisticado quanto o de uma Drosófila, para que consigam aprender também. Se é
que, em pleno século XXI, ainda há fêmeas dispostas a acariciar machos
daquela espécie.
Rafael Linden
Meu caro Rafael,
ResponderExcluirA ciência é maravilhosa, afinal nos confirma, depois de anos intermináveis de pesquisas chinesas na Califórnia e milhões de dólares investidos na empreitada, o que Adão e Eva (nem que seja metaforicamente) já tinham descoberto por pura carência afetiva. O que eles desconheciam naquele éden cinco estrelas, era a opção sexual de certos vândalos atuais, moda que (sem preconceito) só teve inicio, tempos depois (de forma velada e em família) com o nascimento de Caim e Abel.
Forte abraço,
Humberto Borges
Obrigado pelo comentário, caro Humberto. De fato, muitas descobertas são redescobertas. Precisamos, no entanto, considerar que o Doutor Yuh e seus colegas se limitaram a testar contatos físicos entre macho e fêmea. Mas há um cientista da Universidade de Illinois em Chicago, chamado David Featherstone, que demonstrou tentativas de cópula entre machos de Drosófila em certas circunstâncias, interpretando como comportamento homosexual.
ExcluirQue tal sugerir uma cota de 50% de mulheres nos certames futebolísticos em nossos estádios? Politicamente e cientificamente correto?
ResponderExcluirVocê está sugerindo que as carícias ocorram DURANTE os jogos?
Excluir:-)
Puts!
ResponderExcluirÉ cada coisa que se ver!!!!
:-)
ExcluirSomente essas "torcidas" e o crime são organizado nesse país... nada mais!
ResponderExcluirÉ uma lástima.
ExcluirR
Gostei do blog e os posts bem humorado. Aproveito e...
ResponderExcluirFeliz 2014
Abraço
Muito obrigado, volte sempre! Acabei de ver seu blog "Notas e notícias" e achei hilariantes as fotos das " promoções"...
ExcluirAbs
R
É bem capaz da mulher ser esbagaçada, ao acariciar um homem bruto...
ResponderExcluirÓtimo o texto, gostei.
Também acho, Vania. Obrigado pela mensagem
ExcluirR
Oi Rafael, tudo bom meu amigo?
ResponderExcluirSó passei pra avisar que seus links estão sendo aceitos no novo agregador de links do Portal Teia, mas devido a falhas no script e interferência do servidor os links estão caindo no dia anterior quando eram pra cair no dia atual, já estamos trabalhando para encontrar o problema e peço sua compreensão quanto a isso, no começo é assim cheio de probleminhas, mas logo estaremos tudo normalizado.
Obrigado pela força de sempre!
Obrigado, amigo.
ExcluirAbs
R