O grito
“Corno!” O som
ecoa pela igreja, bem na hora da troca de alianças. O pai do noivo, desarvorado,
começa a gritar com a mulher: “Foi isso que você ensinou para ele? A ser corno?
Igual a mim?!”
O padre
eleva a voz, mas o grito se repete: “corno!!”. Amigos do noivo retiram à força o
homem, que continua a berrar: “agora é a tua vez de ser corno!! é a tua vez!!!”
A platéia
confabula: “…é o ex-noivo…não se conforma em perde-la…por que está às gargalhadas?…não
parou de rir nem quando levou aquele soco na boca...”.
O noivo
chora convulsivamente: “o que foi que eu fiz? troquei de lugar com ele!”. A
noiva, impávida, passa-lhe as mãos de leve pelos cabelos e pede calmamente: “pode
continuar a cerimônia, reverendo”...
Uma nova manhã
O jornal
escorrega-lhe pela perna até pousar ao pé da cadeira. O homem contempla em
silêncio a silhueta indistinta da mulher. Esta lhe dá as costas e seu
olhar se perde no exterior emoldurado pelas pesadas cortinas da sala de estar.
Em seu rosto, a luz do sol atinge uma única lágrima, que brilha congelada como
se a humilhação tivesse perdido o ímpeto da véspera.
Fim
de caso
Trinta anos
de um casamento perfeito. Ele, promotor público, prestes a ascender a um cargo
importante. Ela, advogada da maior financeira da capital. Dois filhos
maravilhosos. Salários astronômicos. E, um dia, o telefonema dando conta de que
sua esposa está presa junto com os grandes estelionatários que ele vinha perseguindo
há anos.
Estão todos
na sala, aguardando o juiz. Ele se levanta, calmo, dirige-se ao banco dos réus
e descarrega o revolver sobre a mulher. Surpreende-se com a própria indiferença.
Negociação
O Barriga
foi o último a chegar, como sempre. Norival e Jamanta já tinham pedido a
cerveja e a calabresa. O garçom deixou mais um copo na mesa e retirou-se
rapidamente, trocando olhares significativos com o dono do bar. Ainda se
lembravam da última vez e, caso contrário, lá estavam os buracos na pilastra
como registro da pressa e da má pontaria. Fregueses de boa memória pagaram as
contas e sumiram dali.
O dono
aboletou-se atrás de um barril de chope, à guisa de escudo. O garçom foi para a
porta da rua, olhou as luzes das três favelas que cercavam o botequim,
suspirou, fez o sinal da cruz e pensou na namorada.
Depois de
meia garrafa e duas fatias de amenidades, começou a conferência.
Rafael Linden
As historias curtas são sempre impactantes e surpreendentes, além de convidar á reflexão.
ResponderExcluirComo sempre, parabéns.
Forte abraço
Humberto Borges
Obrigado, Humberto.
ExcluirGrande abraço
Rafael
é... do tácito dos minicontos, passando pelo impacto dos médios, à profusão dos longos... nesse telhado há um contista notável, dá mesmo vontade de sentar ali também :)
ResponderExcluirParabéns Rafael querido!!! Muito bom!!!
Bises
Obrigado, querida.
ExcluirBeijos
Rafael
Adoooorei.... bjosss!
ResponderExcluirObrigado, Adriana.
ExcluirBjs
R
Sensacional a 'negociação'!
ResponderExcluirObrigado, Matheus.
ExcluirR
São todos ótimos textos, realmente... parabéns!
ResponderExcluirMuito obrigado, volte sempre!
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